A Poente...

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terça-feira, 18 de dezembro de 2012

Serra de Muhito

Domingo, levantei-me às 6. Saí com mochila e pau no Surf e às 6h 30 estava no largo de Marrere, em frente ao Hospital, a pegar no A.. Saimos pelo norte até à primeira principal à esquerda, caminho quase sempre bom de areia, um pouco estreito, 3 passagens de ribeiros agora quase secos, e chegamos até à encosta da Serra de Muhito: 30 min de caminho, 15 km. Preparamos-nos para a subida e toca a largar encosta acima; são 7h mas já está calor; mato meio denso, árvores grandes, vamos sem carreiro, capim forte meio queimado, flores de cores muito vivas; depois do primeiro penedo, pequeno vale, muita pedra solta, grande e pequena; recomeçamos a subir, apanhamos antiga machamba e logo depois um carreiro íngreme; não longe ouve-se o bater de alguém que corta madeira; passamos um pau bom, cortado e descascado, a secar; transpiração é muita; sai uma galinha do mato a voar por cima de nós; mais um pouco e atingimos o primeiro colo. Paramos para beber água. Á esquerda, no próximo monte (no principal dos 3 picos), afigura-se uma mulher gigante. No vale em baixo, algumas machambas, poucas casas. Retomamos para o cume à nossa direita (a norte) e deparamos com uma machamba já semeada de milho e logo a seguir mais acima uma palhota em construção (os paus que definem a estrutura). O mato aqui é mais denso, muito bambo e aparecem novas flores (uma parecida com o colchique, diectamente a sair do chão em viojeta e branco), borboletas a acasalar e escaravelhos vermelhos; passam 2 pombos bravos. Subimos um penedo liso, passamos uma árvore estranha e estamos no cume, após 2 horas de subida puxada. Paisagem infinita, Nampula muito ao longe – quase não se vê, montanhas por todo o lado, uma luz prateada ofuscada por um ligeiro nevoeiro enfumado. Um vento fresco extremamente agradável! Sentamos-nos à sombra para comer umas bolachas e beber água; vamos falando; árvore boa para madeira, umbila; árvore boa para tratar as constipações, ferver a casca e misturar um pouco de cinza; árvore descascada, para fazer cordas. Com os binoculos faço o scan aos pontos cardeais: uma picada a oeste; no vale em baixo vê-se roupa pendurada numa casa mas não se vê ninguém; a norte o segundo cume da serra, mas separado do nosso por um profundo vale. Passam andorinhas. Após uma horita de descanso, retomamos o mesmo percurso para o regresso; serão mais 2 horas a decher, sempre com cuidado e sem pressa (para baixo todos os santos empurram, para cima nem o diabo ajuda), passamos uma mangueira e apanhamos 2 grandes e madurinhas no chão; uma antiga machamba, com enormíssimas plantas de mandioca (5 m); algumas bananeiras, sem frutos; massala, outro fruto desconhecido, com desenhos geométricos a verde, passa um cão, sem hesitações e sem coleira, como se fosse dispachado ao seu destino. Aqui as pequenas flores vermelho vivo sinalizam o horizonte próximo, enquanto as formas graníticas elaboradas limitam a perspectiva visual. No útimo relevo, perdemos a localização do carro, andamos um pouco, espreitamos a sul, o sol queima sobre o granito liso – não parece, retomamos a norte, volta a passar o mesmo cão; seguimos o trajecto do mesmo; abordamos a primeira casa; uma mãe de 6 filhos escolhe os grãos de milho do ano passado, ao mesmo tempo que dá de mamar; a filha mais velha ajuda; o marido diz que o carro está mesmo ali ao lado e vai apanhar mangas para nos oferecer; 2 de conversa e retomamos o veículo, não sem que eu tenha oferecido um pacote de caixas de fósforos ao senhor. O regresso é escorreito, boa música; paramos na ponteca do Rio Miaua para tirar umas fotos, 5 raparigas fogem a correr! Depois dizem adeus, de longe. Nos cruzamentos, grupos de mulheres vendem e bebem bebidas fermentadas (de caju -  cabanga e de farelo de milho). Só paramos no mercado de Marrere, para comprar pão, pepino, limão, castanha. 6 horas de viajem e chego a casa. Descanso!

quarta-feira, 12 de dezembro de 2012

Centros

Saí às 15. Reserva Cosmobiológica de Marrere: duas horas de visita inspirada. Céu muito azul, está calor e o verde das árvores é brilhante. Abordei pelo Norte, contornando a nascente. Retomei uma zona, onde já tinha passado várias vezes, sem nunca ter notado nada de especial; nisto, um sinal – ondulação vertical no vento, junto a um relevo; aproximo-me e logo aparecem os outros sinais, tecidos brancos e vermelhos pendem em pontos estratégicos dos ramos dos arbustos e árvores; no centro, um pequeno penedo quase esférico; o local principal, bem à sombra, numa estreita passagem norte-sul, entre um penedo com uma árvore de raízes extraordinárias em adesão total (a Oeste) e um murmuche antigo com um velho tronco de árvore coberto de verde (a Este). Este é sem dúvida o lugar de culto principal do Penêdo sagrado. O murmuche umbigo do mundo, aliado à enorme árvore sinérgica com o penedo, constituem símbolos e realidades principais da religião tradicional. Não muito longe, embora sem ver ninguém, ouve-se uma voz masculina em cadência macua: aleluia, aleluia! Guardo um tempo de reflexão sobre o poder da geomância. As primeiras chuvas já fizeram efeito: o mesmo tipo de arbusto, um ao lado do outro, apresentam folhas de três cores contrastadas: o vermelho vinho vivo, o castanho dourado, o verde puro. Começo a subir na diagoal, rumo a sul, pela rocha lisa, até se tornar impossível andar pelo declive extremo; a cor torna-se negra em faichas verticais, talvez pelo efeito das águas correntes das chuvas? Subo a pique já na extremidade sul; passa uma rapina de envergadura, mal mexendo as asas, subindo lentamente e desaparecendo ao longe; os piáres dos pássaros e insectos vão variando; um passarito de pescoço vermelho acastanhado e asas negras, tipo andorinha, poisa na árvore em baixo; chegam outros dois e levantam os três rápido para baixar até perder de vista. Sento-me um pouco, á sombra; está um vento fresco maravilhoso; aprecio a paisagem; passa um lagarto grosso, castanho vivo e azul. Subo mais um pouco, nem sinal de cobra, apesar dos muitos buracos e nichos convidativos; vou chegando ao cume. A norte, avista-se o rochedo da última viajem; reconheço os outros relevos a nordeste; os horizontes são vastos: a oeste, uma linha de “Iselbergs” imponentes, interrompidos pela serra almejada, estende-se de sul a norte até perder de vista; a este, outra linha de relevos, mais muito mais escassos e menos imponentes; passo ao cume assinalado (sem pretender escalar desta vez), contornando a nascente: saltam dois animais peludos, cinzento e branco, sem rabo, cerca de 40 cm de tamanho; um desaparece logo, um fica a olhar para mim, longamente sem se mexer, meio abrigado atráz de uma pequena rocha, junto ao penedo e local secundário de Mucuto, enquanto eu vou tirando calmamente as fotografias. Retomo sul e oeste, abordando os relevos de meia encosta, enquanto o sol bate. A rapina jovem, talvez pelo calor ou pela presença humana, não dá sinal; impossível localizar o ninho. Em frente, não muito longe da linha de água, por baixo de uma grande árvore, um cemitério familiar. Vou andando e um pouco mais abaixo alguém esteve a descascar castanha de caju com o fogo; as mangueiras estão cheias de mangas, ainda verdes, e os cajueiros nesta fase, mostram muitas castanhas, ainda com o fruto pequeno. Circulo na vertente poente deparando com uma árvore naturalmente quase negra, agora sem folhas, brilhando ao sol como se fosse metálica. As uniões rocha-árvore – cinzento e prata, são esculturas elaboradas, simbióticas de vida e morte. Um pouco mais e estou práticamente no nível do Campus. Não se vê ninguém.

Do outro lado da fractura digital

- Mwâlelo: remédio para produzir mais, atraindo para a própria machamba os produtos agrícolas das machambas dos vizinhos.


- Mulimelo: remédio considerado normal e comum, misturado com as sementes, para obter uma boa colheita. (mas em prática, é ainda um Mwâlelo de defesa, contra a possibilidade do Mwâlelo de ataque).”



Elia Ciscato, Introdução à Cultura da Área Makhuwa Lomwe, Clássica Artes Gráficas, Porto, Portugl, 2012.

sexta-feira, 7 de dezembro de 2012

Lobolo, inicio

Surprise

Em novo ponto de acesso, consegui finalmente reentrar no blog!

domingo, 23 de setembro de 2012

“The chief challenge facing the analyst of contemporary Africa is to explain how the continent can be both modern and undeveloped – that is, what modernization might mean in a context where there is no development as it is normally understood in the West.”

Patrick Chabal, Africa Works, Disorder as political instrument, Africam Issues, 1999, página 144.

Comunitarismo?

“We think it more profitable to analyse the anthropological evidence for existing, and crearly enduring, mentalities which are relevant to the politics of Africa. Of these we would stress fatalism, understood as a rational response to the huge degree of uncertainty faced by most of the continent’s population, and the primacy of the collective over the individual, itself the outcome of a realistic appraisal of what constitutes the best guarantee of survival in the face of a perennially threatening outside world.”

Patrick Chabal, Africa Works, Disorder as political instrument, Africam Issues, 1999, página 130.

Mogincual

Saimos da pensão depois do pequeno almoço e do pagamento do quarto (350 Mt mais 50 Mt para o apoio do cozinheiro), para levar as garrafas vazias à barraca da vila e visitar a Praia de Mogincual; cerca de 7 km de pista de areia, subimos a duna e aparece uma paisagem magnífica, de rio paralelo ao mar com uma língua de terra com casuarinas; o caminho não deche para a praia, mas leva-nos até ao rio, um pouco mais a Sul; um barco grande em construção, outro a ser pintado, estão vários pescadores; está o carro do sul africano com o japonês; não tenho mais bateria no aparelho de fotografias; não apetece tomar banho no rio, no meio do mangal; regressamos a Liupo, deixando depois do rio Mogincual, junto a uma “loja”, uma estrada à esquerda que vai “directa” (?) à praia seguindo depois para Quinga; em Liupo paramos para tomar um sumo na bomba de gasolina, que não tem combustivel. Começa a chover e fechamos “o descapotavel”; a X desiste da condução, está cansada; retomo a pilotagem até Corrane; pista má, muitos buracos perigosos, muita tola ondulada; a chuva agrava-se, o caminho está péssimo com muita lama escorregadia; a pouco e pouco vamos andando e chegamos a Nampula (com 580 km), super enlameada, na saída de Angoche; aqui a estrada está um verdadeiro caos de lama e buracos. Chegamos ao JFS.

sábado, 1 de setembro de 2012

Costa Sul de Nampula

Depois de esperar uma hora pelo açucar para o Café, o dono informa que está tudo fechado, não há açucar – nem matabicho. Visitamos o bairro dos pescadores na vila Angoche, algumas fotografias de predios meio desertos, meio inacabados, algumas boas peças arquitectonicas. Saimos em direcção a Boila, à direita para Namaponda; aqui a estrada que vai para Quinga está inutilizada, não se pode passar; mais à frente, a ponte sobre o Rio Metomode caiu e temos que passar na água; a tracção está ligada e passo sem problemas, com cuidado; continuamos até Liupo e viramos na primeira à direita para Quinga; aldeia pequena, não há onde comer ou dormir; o Sr. José Manuel oferece um quarto e oferece-se para cozinhar; a estrada que está no mapa e que liga Quinga a Mogincual parece estar em más condições, o nosso informante refere que podemos não conseguir passar; vamos pensar o que fazemos e seguimos uns 3 km em direcção à Praia; deparamos com uma casa no alto da duna; o acesso à praia é por um caminho a direito, que desce a duna íngreme, com muita areia solta; penso que será difícil para subir; entramos na casa e perguntamos se existe outro acesso à praia; um homem diz que sim e oferece-se para nos conduzir; entra no carro, seguimos um pouco para Norte e começamos a descer; areia, já em baixo, outra duna íngreme, mais pequena, areia muito solta; o Surf porta-se bem; paramos e damos 20 Mt ao guia que regressa a pé; vamos petiscar o que trouxemos, tirar umas fotografias; em frente à praia, um rio paralelo ao mar onde alguns pequenos barcos à vela e a motor fazem a entrada para o interior; não tomamos banho e voltamos à viatura; subida dificil, carro em 4 altas, quase parou na subida, mas conseguiu. Regressamos a Liupo. Decidimos então ir para Mogincual, onde haverá sítio para dormir, após cerca de 60 km de pista razoável. Logo à entrada está a Casa de dormidas, comida não tem; andamos 3 km até ao centro da Vila e fazemos compras no Mercado (arroz, peixe, cerveja, coca-cola, óleo e cebola); regressamos à casa de dormidas e iniciamos o jantar às escuras, no fogão a carvão; aparece um sul africano e um japonês, parecem à procura de sítios turísticos de praia para investir; ensinamos o cozinheiro deles (que de facto sabe muito pouco de cozinha); vamos-nos rindo; o jantar está muito bom e ficamos ao serão em amena cavaqueira; nisto começa a chover, pesada tropical. Cama, um calor imenso, não há energia para ventoinha (tem algumas lampadas com energia solar).

sexta-feira, 6 de abril de 2012

Contra globalização...




“Following the independence of most African countries in the 1960s, and within the context of the ideological rivalry engendered by the Cold War, the early years of development theory involved an extremely mechanical transposition of concepts fashioned in respect of very distinct Western or Eastern settings. During at least two decades, so-called experts merely transferred their blueprints to an environment whose historical, social and cultural specificities they hardly knew, or even cared to discover.”
“It ought now to be possible to give attention to cultural factors without giving the slightest credence to those who believe in the innate inferiority of Africans”.

Patrick Chabal, Africa Works, Disorder as political instrument, Africam Issues, 1999, página 126, 128, 129.

domingo, 18 de março de 2012

Actualização sobre escravatura

“Os escravos do século XXI não precisam ser caçados, transportados e leiloados através de complexas e problemáticas redes comerciais de corpos humanos. Existe um monte deles formando filas e implorando por uma oportunidade de trocar suas vidas por um salário de miséria. O “desenvolvimento” capitalista alcançou um tal nível de sofisticação e crueldade que a maioria das pessoas no mundo tem de competir para serem exploradas, prostituídas ou escravizadas.”

Luther Blissett.

domingo, 26 de fevereiro de 2012

Feitiçaria, sociedade e política

“Witchcraft, society and politics

It is often overlooked by politics analysts that one of the primary concerns of witchcraft has to do with what we in the West would call therapy. Although much work focuses on the more aspects of this healing process, witchcraft has also been instrumental in providing for psychological or social disorders associated with the modern post-colonial world.”

Patrick Chabal, Africa Works, Disorder as political instrument, Africam Issues, 1999, página 66.

Medicina Africana

“A medicina africana não só tem valor acrescentado pelo uso das plantas para a cura, mas sobretudo pela combinação que faz com a psicoterapia e com os conhecimentos variados da anestesia, vacinação e técnicas de cirurgia. Os bantu tinham há já muito tempo a sua própria aspirina usando uma planta que contém ácido salicílico.”


José P. Castiano, Referenciais da Filosofia Africana, Em busca da Intersubjectivação, Nadjira, Maputo 2010, pagina 246.

quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

“Universidade como espaço de intersubjectivação

O objectivo final é o de estabelecer uma cadeia circular de legitimação dos saberes na qual nos extremos estão as duas tradições de práticas académicas, nomeadamente a formal / moderna (predominantemente escrita) e a local / tradicional (predominantemente oral). A legitimação e a validade do conhecimento produzido, seja no contexto institucional moderno, na base da cultura escrita, seja no contexto institucional tradicional, na base da cultura oral, é feita num espaço coabitado por ambas comunidades epistémicas sobre temas e problemas comuns. Como participantes, os detentores dos pontos-de-vista e dos saberes tradicionais locais ver-se-ão partilhando benefícios para a manutenção e desenvolvimento do seu capital cultural e de conhecimento. O desafio é desenvolver na universidade fóruns e mecanismos de levar o conhecimento localmente legitimado para fóruns mais abrangentes de legitimação global. Os fóruns científicos nacionais e internacionais, devem abrir as suas portas para os portadores dos conhecimentos narrativos dos seus colegas pesquizadores do contexto locail / tradicional. Estes devem ser convidados a expor as suas ideias e conhecimentos no seio da comunidade científica global, numa ronda de diálogo circular.”
José P. Castiano, Referenciais da Filosofia Africana, Em busca da Intersubjectivação, Nadjira, Maputo 2010, pagina 243.

“A segunda crítica (construção) do processo de vigilância epistemológica relaciona-se com a necessidade de o intelectual africano garantir que a sua produção seja responsável em relação às comunidades epistémicas locais, libertando-se dos preconceitos culturais para adoptar uma perspectiva afrocêntrica.”


José P. Castiano, Referenciais da Filosofia Africana, Em busca da Intersubjectivação, Nadjira, Maputo 2010, pagina 242.

domingo, 12 de fevereiro de 2012

Interculturalidades

“Cultura é entendida aqui como a segunda natureza humana, isto é, o processo da criação de formas de conhecimento, das técnicas e de formação de habilidades que visam garantir que o ser homem possa viver, procriar-se e educar aos seus sucessores, enquanto seres humanos. Entendida desta maneira, a cultura é a experiência crítica que o homem faz com a Natureza circundante e com os outros seres humanos e sociedades. A interculturalidade constitui o conjunto de atitudes e predisposições necessárias para um envolvimento mútuo de dois ou mais sujeitos na troca das suas experiências subjectivas, críticas e por si vivenciadas (enquanto indivíduo ou grupos sociais) com os outros: um processo de formação de atitudes e predisposições nos sujeitos por forma a torná-los aptos para o debate entre as culturas.”


José P. Castiano, Referenciais da Filosofia Africana, Em busca da Intersubjectivação, Nadjira, Maputo 2010, pagina 220.

sábado, 4 de fevereiro de 2012

Conhecimento e Sabedoria

“Ciência é conhecimento organizado, enquanto sabedoria é vida organizada. Aqui estão claros os pontos de cruzamento e do distânciamento entre o cientista e o sábio. O ponto do encontro é a organização, ou seja, ambos pensam a vida ou o conhecimento de uma forma estruturada. A sua preocupação é organizar a vida e o conhecimento (sobre ela). O que os distancia é o objecto da sua organização: enquanto um está mais preocupado pelo conhecimento o outro esta mais preocupado pela vida.”

José P. Castiano, Referenciais da Filosofia Africana, Em busca da Intersubjectivação, Nadjira, Maputo 2010, pagina 212.

Filosofia Africana

As liberdades que condicionam a existência de uma filosofia crítica africana são cinco:



A necessidade da filosofia africana se libertar do essencialismo ou do unanimismo (etnofilosofias). A segunda dimensão da qual a filosofia africana deve livrar-se, a religião (a religião faz profecia e a filosofia utopia). A terceira libertação, do debate tradicionalista (poluido pelo misticismo, e concentrar-se na busca de respostas a assuntos que dizem respeito ao futuro). A quarta do mito da oralidade, através do resgate da oratura. A quinta, libertar-se do problema linguístico como condicionante para o desenvolvimento político, social, económico e intelectual do continente.

José P. Castiano, Referenciais da Filosofia Africana, Em busca da Intersubjectivação, Nadjira, Maputo 2010, pagina 209.

quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

Eco ser ?


“Goduca insiste que existe uma unidade na forma de conceber o mundo dos Africanos, assente em cinco princípios. O primeiro princípio sublinha que a responsabilidade individual pela interioridade é uma jornada para a auto-purificação: o caminho para uma paz interna, consigo e com os outros. O segundo princípio é a responsabilidade colectiva em cuidar da mãe terra: as pessoas pertencem à terra, a terra não lhes pertence, procurando viver em harmonia com ela. O terceiro princípio afirma a inter-relação, inter-conexão e interdependência entre os homens e as criaturas vivas e não-vivas: nada existe que seja ou esteja isolado. O quarto princípio sublinha que as identidades individuais e familiares não estão separadas do contexto sociocultural e espiritual. O quinto príncipio diz que a Natureza, as criaturas vivas e não-vivas são o fundamento da realidade espiritual.”


José P. Castiano, Referenciais da Filosofia Africana, Em busca da Intersubjectivação, Nadjira, Maputo 2010, pagina 160.

Filosofia Ubuntu

“De acordo com Broodryk, o ubuntuismo define-se como uma cosmovisão tradicional africana baseada nos valores de um humanismo intenso, carinho, partilha, respeito, compaixão e os respectivos valores associados, valores esses que visam assegurar uma vida comum feliz e humana no espírito familiar. Na educação ubuntu constitui um ritual muito importante introduzir as crianças a todos os membros da família alargada desde muito cedo por formas a que elas conheçam e respeitem a cada um deles na base do conhecimento que tenham do lugar de cada um na hiérarquia familiar. Um outro valor, deveras muito importante e que uma pessoa ubuntu presa em cultivar com devoção, é a capacidade de perdoar. Perdoar pressupõe o exercício de empatia e de simpatia para com o outro. O perdão é tido como divino. O perdão está muito ligado à tolerância, pois é uma das condições básicas para uma vida em comum entre pessoas de diferentes origens mas que se reconhecem e celebram o facto de serem humanos acima de tudo.”


José P. Castiano, Referenciais da Filosofia Africana, Em busca da Intersubjectivação, Nadjira, Maputo 2010, pagina 164.

terça-feira, 24 de janeiro de 2012

Free Africa!

“Asante apresenta como segunda acção libertadora da afrocentricidade a desconstrução do mito da objectividade, mito este espalhado e defendido pela ciência e exportado pelo ocidente para os outros locais culturais. Mas de facto toda a ciência é um conjunto de asserções com a pretensão de serem objectivas. Ou seja, toda a ciência reduz-se a uma questão de discurso, no qual o mensageiro (o cientista) tenta fazer passar a sua mensagem como sendo verdadeira e objectiva. No entanto, todo o conhecimento é político, porque gerado sob determinados condicionalismos sociais e políticos, ou seja, num contexto de poder ao qual o cientista não se pode excluir. O eurocentrista usa um discurso hierarquizante que tem como fim controlar os outros discursos vindos da periferia, sob a capa do universalismo da objectividade.”


José P. Castiano, Referenciais da Filosofia Africana, Em busca da Intersubjectivação, Nadjira, Maputo 2010, pagina 136.

Haverá um futuro?

De acordo com Mbiti, , a História para trás, isto é, do Sasa para o Zamani, do momento experienciado para um longo período em que nada pode ser experenciado. Na concepção tradicional africana, a História não se move para a frente, ou seja, para um futuro de progresso ou para o . Daí que, pode inferir-se, não haja muito espaço, entre os africanos, para ideias ou noções de felicidade, de liberdade, de progresso e do desenvolvimento. Da mesma forma que não há ideias ou noções apocalípticas do mundo e da fatalidade. Não existem implantados no futuro e nem é possível imaginá-lo. O tempo de ouro está somente no Sasa. Portanto não pode também existir um futuro radicalmente diferente do que o que actualmente está a ser vivenciado e experienciado no Sasa
José P. Castiano, Referenciais da Filosofia Africana, Em busca da Intersubjectivação, Nadjira, Maputo 2010, pagina 90.

quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

Time

“O conceito linear do tempo no pensamento ocidental, com um passado indefinido, presente e um futuro também indefinido, é práticamente inexistente no pensamento africano. O futuro (no pensamento tradicional africano) é virtualmente ausente porque os eventos que estão nele ainda não aconteceram, ainda não foram compreendidos, portanto não podem constituir tempo. Se, contudo, eventos futuros dão-se como sendo certa a sua ocorrência, ou fazem parte do ritmo inevitável da natureza, eles constituem somente o tempo potencial, e não o tempo actual.” (Mbiti, 1969, 17)

Uma pessoa só o é como tal quando tem toda a carga dos seus antepassados consigo.”

José P. Castiano, Referenciais da Filosofia Africana, Em busca da Intersubjectivação, Nadjira, Maputo 2010.

quarta-feira, 4 de janeiro de 2012

“Deus em macua diz-se MULUKU, com as correspondentes dialectais de NLUKU no grupo macua-meto e MULUGU no grupo macua-lomwe”.


“Na sociedade macua não existe culto directo a Deus propriamente dito. No culto macua, que consiste fundamentamente, no sacrifício de farinha, oferecido aos antepassados, honra-se especialmente os espíritos ancestrais e antepassados mais importantes da família e da aldeia, considerados como autênticos intermediários entre Deus e os homens. Só indirectamente este culto é dirigido a Deus.”

“Na cosmovisão macua, a sobrevivência dos mortos é definitiva. Os espíritos já não mudam, nem na sua maneira de ser, nem no seu modo de actuar. O seu estado, depois da morte é definitivo.”

“O sacrifício tradicional macua (MUKUTTHO) é o sacrifício que se oferece aos antepassados da família ou (e) da comunidade, já que estes são considerados vivos e com poderes sobre-humanos eficazes, com a finalidade de estabelecer a comunhão entre os membros da família ou (e) da sociedade, os antepassados e Deus”.

Francisco Lerma Martinez, O Povo Macua e a sua Cultura, Paulinas, Maputo, Moçambique, 2008.